SSL 12 (Such Sounding Love) por António Gil

Tendo segurado uma posição no mercado dos interfaces de mesa, com os SSL2 e SSL2+, a marca resolveu dar o passo seguinte, indo na peugada de outros fabricantes que também o fizeram, depois de perceber que a actual “produção em casa” já não é somente um teclado de plástico, um interface para ligar um microfone ou guitarra e uma computador. 

Assim, com a nova SSL12, a clássica marca obriga as restantes a terem de subir pelo menos mais uns degraus, isto se não for mesmo uma torre inteira.

_Mas vamos lá deixar a conversa fiada e passar ao que é importante.

O Interface SSL 12 tem logo à partida uma enorme mais valia, que é o fabuloso som criado pela SSL nas suas mesas 4000. Mas a verdade é que esta funcionalidade já se encontrava nos interfaces anteriores, o SSL2 e SSL+. 

Os seus utilizadores simplesmente adoraram a pequena mas realmente eficaz possibilidade que o simples premir do botão 4K traz. O som fica com mais recorte, ganha presença, ou como se diz na gíria “senta-se na mistura”.

Mas obviamente que a SSL não ia lançar mais um interface só para satisfazer os clientes com o seu som. Na realidade o que fizeram foi pegar nas funcionalidades já existentes destes dois anteriores interfaces e juntar ainda bastantes mais funcionalidades.

 

Assim a SSL12 tem quatro entradas, colocadas na parte de trás do interface, com fichas de ligação Neutrick Combo, permitindo assim ligar cabos XLR ou jack TRS.

Na parte da frente do interface estão duas fichas Jack TRS já devidamente preparadas para ligação de instrumento, ou seja de alta impedância.

Já agora devo indicar que para as quatro entradas físicas na parte de trás, temos por cima de cada uma, no painel frontal (indicadas de Channel 1 a 4) três botões que nos permitem escolher que tipo de entrada pretendemos, se é necessário fornecer alimentação fantasma (48V), se a entrada é tipicamente de linha e ainda um corte de graves (filtro de passa altos \ Hi-Pass filter colocado nos 75 Hz, a 18db de corte fixo), o que é muito bem pensado e simplifica na captação\gravação de vozes, e certos instrumentos como flautas, violino, Overheads de bateria, etc.

Mas no que diz respeito a entradas a SSL12 não se fica por aqui. Para alem de permitir ainda mais quatro entradas “virtuais”, duas para os canais de TalkBack e duas para a funcionalidade de LoopBack, uma funcionalidade que foi adicionada já há algum tempo atrás através de uma revisão de firmware (para todos os interfaces existentes) e que permite, para alem das entradas físicas, ainda se possa juntar o resultado de tudo o que esteja a sair\soar nas saídas de monitorização… que na realidade são as saídas Master. Algo ao estilo dos antigos Bounce de Master, mas agora em versão digital.

Portanto a SSL12 coloca assim uns teóricos oito (8) canais de entrada, directos no interface. Mas já que estavam a mexer, decidiram fazer a coisa bem feita e juntaram a capacidade de ligação ADAT, possibilitando assim a ligação de um interface deste formato, capaz de dar mais oito (8) canais de entrada ao interface. Se tiverem um interface ADAT, basta ligarem esse interface à SSL12 e imediatamente ficam com a capacidade de gravar até 16 canais em simultâneo. Ora então, dizer que a SSL12 é “somente” mais um interface de audio digital de mesa já deixa de ser uma afirmação “verdadeira”. 

Quer dizer, o interface tem realmente esse formato, mas se o ligarem a um interface ADAT de oito entradas, então a típica asserção da palavra, no que toca a identificar este tipo de interfaces, deixa de fazer sentido.

_Mas a coisa ainda tem mais pormenores.

A tudo isto juntam-se ainda quatro saídas (dois pares estéreo ou, dependendo da configuração que coloquem na DAW, podem ser quatro saídas independentes). Estas saídas, nomeadas de forma inteligente de 1 a 4 têm ainda pequenos pormenores de “malvadez”, onde as saídas de Mon (1 e 2) são de base as que existem para ligar o nosso sistema de escuta (seja directamente a um par de colunas\monitores activos ou amplificador no caso de monitores passivos), sendo que nesta situação, o que sai das saídas 3 e 4 é um espelho. Mas estas saídas podem ser utilizadas para ligar outro par de sistema de escuta, e premindo o botão ALT passamos a ter acesso a elas como um outro par independente de escuta. Excelente. 

Temos ainda as saídas para auscultadores 1 e 2, que permitem que duas pessoas monitorizem desta forma o que se está a gravar ou misturar. E cada uma destas saídas tem associado um potenciômetro para regular o nível de cada par de forma independente.

E para não deixar nada ao acaso, existem ainda na parte de trás, junto das saídas audio, duas ligações MIDI, uma de entrada e outra de saída, em fichas tipicamente deste formato, ou seja fichas DIN de cinco pinos.

Portanto temos então um excelente e completíssimo interface criado por um dos nomes mais respeitados da industria, com conversores capazes de trabalhar até 192 kHz de amostragem e 32 bit de profundidade. Isto só por si já seria suficiente. 

Mas falta um pormenor. Então como se controla tudo isto? Se não existem faders ou potenciómetros para tudo isto (na realidade só existem quatro para os níveis de entrada, o que controla os níveis de saída e os dois para os auscultadores), como se controla tudo o resto?

É aqui que entra o software de controlo SSL360.

Basta instalar este software, ter o interface ligado ao computador onde vai ser utilizado e ao lançar o SSL360, este vai reconhecer automaticamente qual o hardware\interface ligado e apresenta logo todas as funcionalidades, num dos melhores designs gráfico que já vi. Simples, efectivo, onde tudo é basicamente auto-explicativo e à prova de erro.

Podemos ligar\desligar as entradas (inputs), tanto as existente no interface como as do sistema ADAT, é possível controlar níveis através de faders virtuais, deixando somente para o hardware a parte mais difícil, que é a secção de ganho, podemos controlar o nível da entrada de TalkBack, controlar os níveis das saídas, e é neste software que se controla tudo o que tem a ver com os endereçamentos de saídas das tais saídas ALT (respectivamente 3 e 4). É lá também que se controla o que pode ser endereçado nos auscultadores, possibilitando encaminhar tudo de forma a espelhar o que sai do Monitor (que é o Master…a que a SSL preferiu chamar Monitor em vez de Master, apesar de coloca o nome de “Master Fader” por baixo dessa pista).

Ao lado desse Master Fader está a secção que permite escolher o que se está a ver (desde que se tenha um ecrã de pelo menos 27” já é possível visualizar a mesa virtual na sua totalidade), desde o que estão a fazer os botões de Cut (que corta o som todo a tudo), ALT (que permite a tal activação de ter as saídas 3 e 4 como saídas alternativas), um botão, que para mim deveria também existir no interface  em si, mas infelizmente está só disponível n mesa virtual, que coloca o que se está a ouvir em Mono. Isto é essencial para verificar situações de fase, erros que existam na equalização, etc. Ao seu lado está um botão que permite inverter a fase do que estamos a ouvir. Sinceramente não percebo o porquê deste botão no Master. Se invertermos a fase na saída Master não vamos “perceber” directamente se algo está mal. Se este botão estivesse disponível nos vários canais de entrada, então fazia todo o sentido, para verificações como as que indiquei atrás. Mas no Master, só inverte as fases Esquerda com a Direita. No entanto é preciso indicar aqui que este botão funciona ligado à secção de monitorização ALT, o que quer dizer que permite verificar as diferenças de fase também entre o que está nos canais Master e nos canais ALT.

Existe ainda um botão de DIM, que permite baixar os níveis da escuta para um nível mais baixo, possibilitando assim que se oiça não só o que estamos a dizer via o TalkBack, mas também poder falar uns com os outros na sala.

Continuando ainda no software de controlo SSL360, temos ainda nos canais individuais a possibilidade de escolher na secção de Headphones (auscultadores) a escolha do que estamos a ouvir, se é derivado da mistura 1 e 2 e se segue sempre essa mistura ou escolhe ter o sinal a vir de outro lado, controlo do volume via um fader para cada par de auscultadores, e independente mas em soma com os potenciómetros de nível existentes em hardware no interface, temos a possibilidade de escolher se o que estamos a ouvir é AFL (After Fader, ou seja depois da soma do que é misturado no Fader) ou se fica Pré (ou seja ouvir o que estamos a captar\gravar de forma diferente do que está já gravado). Podemos fazer também Cut desse canal de auscultadores (o que a realidade não deverá ter grande funcionalidade), colocar a mistura desse canal em Mono (isso sim pode ser útil) e finalmente escolher se os Sends (envios de sinal desse canal) é Post Fader (ou seja depois da soma do fader).

A possibilidade de se ter a escolha de se os faders e canais dos auscultadores seguem a mistura 1 e 2 ou se vêm de outro lado é uma funcionalidade muito bem vinda e que demonstra que este interface foi criado e feito por quem sabe destas coisas a sério, neste caso a SSL.

Em cada canal individual de entrada e de Playback (correspondentes às tais saídas 1\2, 3\4, 5\6 e 7\8) temos potenciómetros virtuais de Send que permitem escolher para onde se envia o sinal, criar panorâmicas nesses envios, enviar níveis diferentes  de escuta para os auscultadores, e caso se tenha desligado a função“Enable”, ou seja activa, da saída ALT, podemos ter acesso às saídas 3 e 4 de forma independente e ter também envios independente para essas saídas, tanto de volume geral como de envios para auscultadores.

Por fim, neste software podemos escolher o Sample Rate do interface, o relógio de sincronismo e qual a fonte sonora que envia os sinais de áudio para as entradas de LoopBack.

Algo interessante neste software de controlo é que apesar de não reconhecer os interfaces iniciais, ou sejas os SSL2 e SSL2+, já reconhece tudo o resto daí para a frente, incluindo os controladores em hardware SSL UF1 e UF8.

SSL12 vs RealWorld

Depois de ter recebido o interface, bastou desligar o meu interface SSL2 e ligar via cabo USB C ao novo interface. Ao ligar o computador, o interface foi imediatamente reconhecido, o que indica que o driver serve exatamente para todos este interfaces, o que simplifica muito as coisas. Inclusive mais tarde liguei também o meu SSL2 e consegui ter sempre os dois interfaces a trabalhar perfeitamente lado a lado (mais sobre isto lá para a frente).

No entanto algo que aconteceu assim que se abriu o potenciômetro de Monitor\Volume, foi ouviur-se imediatamente algum ruído de fundo, o que parecia indicar nada de bom em relação a este interface. Quanto mais se aumentava o nível de escuta maior era o ruído. Depois de um momento de cabeçadas na parede e de não acreditar que tal seria possível, resolveu instalar-se o software de controlo… e obviamente que resolvemos logo a seguir chamar nomes uns aos outros. 

Assim que o software de controlo SSL360 reconheceu o interface (o que foi imediato) abrimos a página da mesa virtual e descobrimos que por defeito, os canais de entrada, tanto analógicos como virtuais, os canais de saída, vinham todo abertos com o fader Normalizado (a 0db, normalmente a 85% do seu curso total). Bastou baixar os canais individuais, colocar os faders de Monitor e restantes de forma correcta e o interface SSL apareceu na sua grandiosa natureza. 

Algo que também se descobriu foi que existia uma diferença de níveis de saída entre o SSL12 e o meu SSL2. O SSL12 tem mais “pedrada” no output. Depois de várias medições chegou-se a uma conclusão que, apesar de lógica, o fabricante devia mencionar. Por alguma razão os interfaces SSL2 e 2+ não vêm com um nível de saída de calibração (ou ponderação) de cariz profissional (atenção que isto é somente na escuta “para fora”, ou seja o nível\volume que enviam para o sistema de escuta), estando em principio calibrados para níveis de sistemas de linha doméstica, ou seja -10dB, enquanto que o SSL12 vem calibrado a níveis de escuta profissional (+4dB). Esta simples diferença coloca logo este interface numa outra classe, mostrando mais uma vez a sua linhagem derivada de um dos mais respeitados e conceituados fabricantes de sistemas de som profissional.

Depois de tudo colocado no sitio (que basicamente foi fazer Cut aos canais de entrada) o SSL12 imediatamente tomou o lugar de “Big Boss” no estúdio.

Estando assim “escolhido” o novo centro do estúdio, passei para a fase de testes práticos com as várias DAW que tenho instaladas e que são as minhas ferramentas de trabalho, Nuendo 12, Harrison MixBus 32C (V9), Logic Pro10 e ProTools 2023 (versão Nativa). Também testei com os editores Wavelab Pro 11 e Acustica 7, mas como estes estão basicamente configurados para edição, a mudança não foi notada.

Mas nas DAW foi bastante notada. 

No Nuendo imediatamente apareceram os múltiplos canais de entrada e saída, tal como no Logic e no MixBus32C

Algo bastante interessante foi que consegui fazer um setup chamado SSL INTERFACES, (depois de também ter ligado o meu interface SSL2 e ter criado um “Device Agregado” em que juntei os dois interfaces sob um único driver de forma a ter tudo unificado), foi ficar com as três saídas de auscultadores a trabalhar de forma independente, possibilitando na DAW escolher o que enviava para cada par de auscultadores, com controlo directo sobre três escutas de auscultadores totalmente independentes. Na realidade, de forma teórica, fiquei assim com um sistema capaz de até 20 entradas de audio digital e 10 saídas. Isto a contar com as entradas e saídas virtuais, ADAT, LoopBack, etc… Nada mau!

Fiz gravações com vários microfones (Neumann, AKG, Røde, Shure) tanto dinâmicos como condensadores, incluindo ter várias fontes e canais abertos em simultâneo, assim como instrumentos (uma guitarra e um baixo), tanto na SSL12 como na minha SSL2 e devo dizer que as gravação soam perfeitas. não se sente diferença entre ambos os interfaces a este nível, também derivado do facto de que os prés de ambos são excepcionais. Um pormenor importante para isto (e segundo o que me disseram da parte da SSL) é que os estágios de pré, estão totalmente desacoplados da placa-mãe dos interfaces, o que faz com que não exista nenhum tipo (pelo menos teoricamente) de interferência nos sinais captados e gravados. E como “cereja no topo do bolo” o tal botão que faz a emulação dos prés da 4K faz toda a diferença.

Com ele desligado, o som gravado é perfeito, limpo, mas assim que se liga este botão, que mostra a vermelho e de forma muito orgulhosa “4K”, imediatamente se sente a tal presença, recorte e até um certo punch (pelo menos na gravação de baixo foi o que se sentiu), que mostra a herança vinda da fabulosa mesa SSL 4000.

Há uns tempos atrás li algo sobre análises e testes em que quem os fazia parecia que estava ser pago para dizer a coisa assim. Portanto o que posso dizer em minha defesa é que gostei tanto que encomendei um para mim, que vou pagar. Portanto foi com lágrimas que me despedi deste fabuloso interface, mas sabendo de antemão que já tenho um encomendado, fiquei mais descansado.

Caso andem a procurar um interface de alta qualidade, com funcionalidades muito boas, excelente som, com as tais mais-valias que mencionei, e acima de tudo a um preço que não rebenta nenhuma carteira, pensem bem, verifiquem este SSL12 e se possível façam uns testes a ver se é mesmo o que procuram. Do meu lado só posso dizer que foi a minha escolha…e já tenho um SSL2… que agora vai ficar a trabalhar com o seu irmão maior.

António Gil

Produtor, técnico de som e musico, no ativo desde 1984, inicialmente como musico, tocando com várias bandas e artistas nacionais, desde 1994 criou o seu proprio estúdio de gravação, tendo trabalhado com muitos artistas e bandas, tanto a nível nacional como internacional. 
Foi editor-técnico de várias revistas ligadas ao meio profissional do Som e Áudio. 
É também professor e formador nas escolas ETIC, EPI e Val do Rio. 
No seu (pouco) tempo livre aproveita para brincar com o seu cão Ziggy e ver séries e filmes (fã de "fantástico" e "ficção cientifica").